
Pesquisa: Mahavidya
Recife, 25 de outubro de 2025.
A história deste insigne músico teve seu prólogo na acolhedora cidade de Bonito, no coração de Pernambuco, onde Félix Lins de Albuquerque – carinhosamente apelidado de Felinho – nasceu a 14 de dezembro de 1895. Foi sob os auspícios desta terra que o fado do virtuose se cumpriu, e a sua jornada musical se desdobrou como uma partitura adornada de pura harmonia.
A iniciação de Felinho não foi branda. O seu tio paterno, João Archelau Lins de Albuquerque, um erudito de sólidos cabedais musicais, impôs ao sobrinho um rigor quase sacrossanto, exigindo-lhe que a leitura musical fosse domada em todas as claves. Foi um batismo de fogo e amor, que forjou no petiz uma base inata para a suprema maestria.
Essa disciplina fecundou o talento com uma celeridade admirável: aos quinze anos, o rapazola já era o timoneiro de bandas em vilas como Catende, Ribeirão e Barreiros, impondo o seu ritmo perfeito no interior de Pernambuco. Mais tarde, absorveu a arte do clarinete e do trombone com Antônio de Holanda, um virtuose que havia regressado do Rio de Janeiro, enriquecera a sua paleta instrumental.
O chamamento da capital foi irresistível. Trocando o recato do interior pelo frenesim do Recife, Felinho exibiu o seu clarinete nos cinemas e cassinos da época. Mas foi a partir de 1920 que a sua influência espalhou-se com mais ardor: retornando às viagens pelo sertão, retomou a batuta das bandas, e, em um gesto de nobreza pedagógica, dedicou-se a instruir os rebentos dos abonados senhores do açúcar.
O ápice da sua carreira desabrochou em 1932. Na PRA 8, a venerável Rádio Clube de Pernambuco, ele assumiu o leme do famoso Regional do Felinho, transformando o ar das ondas radiofónicas em música pura. Foi nesta praça que engendrou o Quarteto de Saxofones Ladário Teixeira, reverenciando o companheiro mineiro. Concomitantemente, o seu nome gravava-se na história: integrou a Orquestra de Concertos e, como flautista, foi um dos baluartes na inauguração da magnífica Orquestra Sinfônica do Recife.
Apesar de toda a efervescência profissional, a fonte da composição jamais estancou. As suas entranhas musicais deram à luz melodias que são puros suspiros da alma, como os choros "Amoroso", "Apaixonado" e o profundo "A Vida é um Choro". As valsas, impregnadas de um sentimento puro, como "Olhos que Mentem", "Silêncio" e o enternecedor "Triste Consolo" – esta última, um aceno à sua amada que viria a ser sua esposa – testemunham a imortalidade dos seus sentimentos.
Contudo, a façanha que cravou o seu nome na eternidade do Carnaval foi a sua epifania sobre o frevo "Vassourinhas". Em 1944, o Carnaval ardeu com uma "novidade" que não era a melodia, mas sim a esplêndida arquitetura que Felinho lhe impôs: oito variações virtuosas para clarinete (ou saxofone) que infundiram no frevo uma destreza, uma graça e uma "quentura" irretocáveis. A partir desse momento, o "Vassourinhas" transmutou-se. Felinho criou escola, e a sua invenção tornou-se o padrão, a prova de fogo onde cada instrumentista, de Sivuca a Dominguinhos, demonstra a sua intimidade com a obra do mestre.
A 9 de janeiro de 1980, no Recife, o sino da vida de Felinho calou-se. Mas o silêncio foi enganoso, pois a sua vasta obra, que inclui os choros 'Formigão', 'Pretensioso' e a valsa resgatada 'Triste Consolo', ressoa com um eco eterno. O gênio que fez o frevo vibrar não se foi; ele vive em cada nota acelerada, em cada palavra melodiosa, assegurando que o seu atman seja o patrimônio imortal da música brasileira.
CRONOLOGIA
1895 - Nascimento de Félix Lins de Albuquerque (Felinho) em Bonito, Pernambuco (14 de dezembro).
1920 - Início das viagens ao interior, retomando a regência de bandas e lecionando música.
1932 - Trabalha na PRA 8, Rádio Clube de Pernambuco, onde chefia o Regional do Felinho e cria o
Quarteto de Saxofones Ladário Teixeira.
1944 - Introduz as 8 variações para clarinete no frevo “Vassourinhas”, tornando-se referência.
1980 - Falecimento no Recife, Pernambuco em 9 de janeiro, aos 84 anos, deixando uma vasta obra
musical.
PRINCIPAIS OBRAS
*Choros
• Amoroso.
• Apaixonado
• A Vida é um Choro
• Formigão
• Formigueiro
• Pretensioso.
• Meu Choro a São João
• Contemplando
• Venha para o Choro, seu Paiva
• Sacrifício por Amor
• A Saudade Vive Comigo
• Soluços
• Suave Tortura
• Delírio de Amor
*Valsas
• Olhos que Mentem
• Silêncio
• Triste Consolo (dedicada à esposa, resgatada em LP de 1987)
*Arranjo de Frevo Notável
• Variações para o frevo Vassourinhas
AO MESTRE COM LOUVOR
Na cidade do frevo, onde a arte se aprimora,
Felinho, o saxofonista, marca a sua história.
Para o "Vassourinhas", frevo de alma e tradição,
Criou variações em 38, com o coração.
No metal que reluz, seu sopro era um primor,
Um toque magistral, de atípico fulgor.
A melodia original ganhou um novo tom,
Um feito assombroso, firmado com louvor.
Pois na orquestra de Nelson, a arte se revela
O gênio do saxofone, numa eterna tela.
Seu legado de notas, o tempo não desfaz,
No frevo de rua, sua glória sempre jaz.
Autora: Mahavidya
Pesquisa:
Mahavidya